Feira Solidária Maria do Céu - uso da moeda social Cuca para acesso ao alimento agroecológico.

Feira Solidária e a conexão com passos que vêm de looooonge

A Feira Solidária Maria do Céu ocorre quinzenalmente, aos domingos, na Feira da Roça Agroecologia e Cultura de Vargem Grande. Desde a pandemia estourada em 2020, as mulheres organizadas da Teia de Solidariedade da Zona Oeste viabilizaram a distribuição de alimentos, kits de higiene e autocuidado em vários territórios da ZO. Nas Vargens, com o apoio da Rede Ecológica, da própria Teia e da Feira foi possível apoiar a agricultura urbana que ocorre na região e fazer chegar um alimento fresco, limpo, saudável, sem agrotóxicos para cerca de 30 famílias da região, com destaque para as das comunidades de Cascatinha e Santa Luzia. Recentemente, em outubro de 2022, implementos a moeda social CUCA em homenagem a Dona Cuca, importante ancestral de nosso território a quem reverenciamos. Com a CUCA, as famílias conquistaram sua autonomia para comprar os alimentos diretamente dos agricultores que comercializam seus produtos na Feira da Roça.

 

O que diferencia nosso trabalho de uma ação puramente assistencialista é a nossa prática e nosso horizonte estratégico. Do ponto de vista da nossa prática, é importante ressaltar que toda a logística de distribuição desses alimentos frescos está ancorada na organização popular e comunitária sob forte protagonismo das mulheres. Temos ainda um recorte interseccional que nos leva a priorizar tanto do ponto de vista de quem produz, quanto de quem recebe, quanto de quem atua como articuladora no território, negros e negras porque entendemos que essas são as pessoas mais afetadas pelo racismo estrutural vigente. Isso não impede que mulheres brancas antirracistas, que famílias brancas pobres e que agricultores brancos também sejam contemplados por nossas ações ou participem dessa construção, mas quando trazemos esse recorte interseccional e essa priorização dialogamos com uma realidade social que não pode ser ignorada, tal como demonstrado por inúmeras pesquisas: quem mais morre de fome, de bala e de covid, quem se encontra em maior vulnerabilidade nesse país são as famílias negras, sobretudo aquelas chefiadas por mulheres negras. 

 

Nesse sentido, nosso horizonte estratégico dialoga com duas dimensões fundamentais: uma é a de movimentar as mulheres negras a partir de nossa organização popular compreendendo que, tal como anunciado por Angela Davis, “quando uma mulher negra se movimenta, toda a estrutura da sociedade se movimenta com ela”; em segundo lugar, está a perspectiva de construção de um caminho que avance para a soberania alimentar e geração de renda nos territórios. 

 

Alem da distribuição dos alimentos, temos a intenção de avançar também na construção de hortas comunitárias nos territórios, na associação de moradores, no posto de saúde, nas lajes, nos terrenos baldios e onde mais possamos desenvolver uma agricultura urbana baseada na agroecologia que se utilize dos saberes populares e tradicionais para produzir o alimento que tanto necessitamos, sem uso de veneno, nem agrotóxicos. Realizamos também oficinas que possam contribuir na geração de renda para essas famílias através de intercâmbios culinários, de produção de sabão a partir do reaproveitamento do óleo de cozinha, de costura de absorventes de pano, entre outras.

 

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Autora: Mariana Bruce

Sobre a autora: Mariana Bruce é uma mulher branca antirracista, mãe da Duda e da Flor, moradora de Vargem Grande, professora e colaboradora da Teia de Solidariedade da Zona Oeste